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Como práticas pautadas no diálogo, na empatia e no acolhimento fazem a diferença na hora do parto
Seis horas de silêncio e sintonia: foi assim que Bruna Aguiar de Oliveira Guedes deu à luz o filho Bruno. O foco, sempre no bebê. Incômodo? Quase nenhum. Bruna escolheu ter um parto normal, humanizado. Para isso, preparou-se meses antes, escolhendo com antecedência o hospital e a equipe que a acompanharia. “Eu me senti em um ambiente acolhedor, e eu pude parir em paz, ao som de uma música agradável, com cheirinho de lavanda no ar, pouca luz e muito amor”, conta a mãe. Bruno é o segundo filho de Bruna com o companheiro Gustavo Guedes. Três anos antes, eles tiveram a Liz, mas em um cenário bem diferente. “Na época, foi muito especial, mas não foram realizadas práticas de acolhimento como desta vez”, lembra Bruna.
A humanização vai além do conhecimento científico e tecnológico dos profissionais envolvidos no parto. Ela passa pelo conhecimento empírico, além das experiências sociais, familiares e individuais de cada um. São várias características, com influência na qualidade da assistência prestada às famílias durante o processo do parto.
No Brasil, uma das estratégias para avançar na assistência humanizada das mulheres é o projeto Rede Cegonha, que visa à integração dos profissionais de saúde e o empoderamento das mulheres. Há três anos, uma nova diretriz do Ministério da Saúde determinou a incorporação de medidas para tornar o atendimento às gestantes mais humanizado no SUS. No entanto, a implantação é de responsabilidade de cada município e vem acontecendo de forma gradual.
O PAPEL DA DOULA
Para o último parto, Bruna contratou a doula Luana Citadin para fazer todo o acompanhamento. Vários estudos mostram que o parto com uma doula (o termo grego para “mulher que serve”) pode encurtar o tempo de trabalho de parto, além de reduzir significativamente o uso de analgésicos. A maioria não tem formação médica: não substituem um médico ou o profissional responsável pelo parto, nem desempenham o papel de enfermeira. “A partir do momento que a mulher passa a ir em busca de informação de qualidade, estuda e entende os riscos e benefícios de cada tipo de parto, ela se empodera. A mulher assume o protagonismo desse momento e acessa uma força que todas têm, basta que ela seja alimentada”, explica Luana. A atuação das doulas é reconhecida e estimulada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo Ministério da Saúde.
CESÁREA HUMANIZADA
Luz baixa, sala com a temperatura aquecida e diálogo entre a mãe e os profissionais envolvidos no parto. Características que normalmente descrevem um parto normal humanizado, mas que estiveram presentes no parto de Manuella Wensing Redivo, 33 anos, que teve a filha mais nova, Mallie, por meio de uma cesariana. “Eu entrei na sala de cirurgia e estava tocando uma seleção de músicas que nós tínhamos feito anteriormente para ouvir durante o parto. Além disso, eles deixaram meu marido entrar na sala com dois ursinhos de pelúcia nos bolsos, dados de presente para mim pelas minhas outras duas filhas. Assim que a Mallie nasceu, ela foi direto para os meus braços. Diferente dos outros partos que eu tive, onde eu só via a criança depois de ela ter passado pelo pediatra, por vacina, e vários outros protocolos”, descreve.
Antes de Mallie, Manuella teve com o marido Jaime as filhas Maya, hoje com cinco anos, e Aylla, três. Elas também nasceram por meio de cesarianas, sem a presença de doula. “Não tenho preconceito com parto normal. Inclusive, tenho amigas que tiveram parto em casa, outras que tiveram parto normal humanizado no hospital. Eu escolhi cesárea por considerar mais seguro para mim, tive meus motivos. Não me arrependo. Eu acho que o importante é a mulher ter o poder de escolha”, ressalta Manuella.
Em muitos países, as taxas de cesarianas aumentaram drasticamente nos últimos 20 anos. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o ideal seria fazer cesarianas em, no máximo, 20% dos partos. Mas, por aqui, a realidade é bem diferente. O Brasil ocupa o 2º lugar do mundo no número de partos desse tipo, com uma taxa acima de 55% do total de partos. Na América Latina, região com maior taxa de intervenções (44,3%) do mundo, o país perde somente para a República Dominicana (58,1%), segundo dados da OMS.
Uma outra pesquisa, realizada pela Fundação Oswaldo Cruz, aponta que no setor privado 88% dos partos são realizados a partir de cesáreas. Já no setor público, os números caem para 46%. Apesar de muitas gestantes optarem por realizar esse procedimento apenas por preferência, para outras a cesárea é extremamente indicada, principalmente quando existem fatores de risco tanto à mãe quanto ao bebê. “Quando bem indicadas, as cesáreas servem para garantir a segurança do nascimento. Mas até nestes momentos, quando a equipe é pega de surpresa, é preciso comunicar a mãe, com cuidado, o motivo da decisão de realizar uma cesariana. Ela precisa entender por que está acontecendo aquilo”, ressalta a ginecologista e obstetra Graziela Gonçalves Porto.
MUDANÇAS
A médica complementa que as mudanças foram ocorrendo ao longo do tempo, e que a classe médica passou a se conscientizar da importância do protagonismo da mulher durante o parto. “As histórias sobre violência obstétrica não são falsas. Antigamente, era comum ouvir um médico ou um membro da equipe dizer para a paciente: ‘Faz mais força! Você não está se ajudando!’. A episiotomia – corte que é feito para o neném sair – era muito mais comum. Também era normal deixar a sala com o ar-condicionado congelando, pelo conforto da equipe, que geralmente está toda equipada com avental e embaixo daquela luz quente. Hoje em dia, a prioridade é a gestante: a sala fica aquecida. Tudo isso acontece como forma de humanizar o parto, seja ele normal ou cesárea”, finaliza.
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